terça-feira, 3 de setembro de 2019

O PREGADOR


Ele tinha o direito de dizer tudo o que queria, e dizia.


 Havia um homem que pautava a sua vida pelo princípio da liberdade, da autenticidade e da permissão.


Sim, ele se permitia, acha importante se permitir dizer com autenticidade e sinceridade tudo o que desejava dizer e até o que não desejava, mas que lhe vinha à cabeça, ou melhor, que lhe vinha à boca, nem sempre à cabeça.

Vamos dar um nome fictício a este homem em respeito ao seu direito de anonimato, vamos chamá-lo de senhor Prolixo.

O senhor Prolixo orgulhava-se de falar a verdade na cara das pessoas, fosse quem fosse, ele não mentia, não disfarçava, era sincero.

Ele entendia que guardar coisas e deixar de dizer algo poderia lhe fazer mal e ainda tirava a autenticidade das relações.

Quando alguém achava ruim e reclamava com ele, não entendia como as pessoas não gostavam que ele fosse sincero. Ele não falava pelas costas e não levava desaforo para casa.

Com o passar do tempo Prolixo percebeu que algumas pessoas começaram a se afastar dele, começou a perder amigos, a perder namoradas, a perder empregos, a afastar parentes, a ver pessoas feridas, machucadas e até chorando e tristes por causa das suas palavras.

Quando se deu conta, Prolixo estava vivendo sozinho, estava isolado, não tinha mais amigos nem ninguém que conseguisse conviver com ele, pois sabiam que em algum momento ele os feriria com suas palavras.

O Senhor Prolixo pensava: “que gente chata, que gente molenga e sensível, não se pode dizer nada, se ofendem com tudo”.

Mas um dia ele cansou de viver sozinho e de machucar as pessoas. Tentou se controlar, mas não conseguia, acabava dizendo. Depois pedia desculpas e muitos o desculpavam com sinceridade, mas ainda assim não conseguia mais reaver a amizade, ou o amor, da mesma forma. E acabava ofendendo novamente.

Então foi falar com seu avô, um velho carpinteiro, porque com seu pai ele não podia mais falar, havia ferido e magoado o pai muitas vezes.

Naquela época, as pessoas mais velhas, mais experientes, que já tinham vivido bastante, como o pai e o avô, serviam como o coach de hoje em dia. Quando alguém estava com uma dúvida, com algum problema, precisando de um rumo, se aconselhava com alguém mais velho, com vivência, com experiência de vida.

Então o velho vovô carpinteiro ouviu o neto, suas histórias, suas queixas e explicações e o levou até uma parede de madeira que ele mesmo havia construído.

Mostrou a parede de madeira nova ao neto, entregou-lhe um maço de pregos e um martelo e mandou que ele pregasse pregos por toda aquela parede, de cima abaixo, um ao lado do outro, por toda a extensão.

E o velho saiu, deixando Prolixo sozinho, pregando pregos.

Depois de um tempo, Prolixo terminou de pregar e avisou seu avô, que o acompanhou até a parede. Enquanto os dois Olhavam para ela, o velho perguntou o que ele via, e ele respondeu que a parede estava cheia de pregos.

Então o velho ordenou que ele arrancasse todos os pregos, e saiu.
Prolixo já estava irritado, quase dizendo umas verdades ao seu avô, mas também estava muito curioso para saber onde ia dar aquilo tudo. 

Então arrancou todos os pregos e chamou o seu avô novamente, que lhe perguntou:

- o que você está vendo?

 E o neto respondeu, irritado:

- Estou vendo uma parede cheia de furos, ora!

E então o velho carpinteiro explicou ao neto, que assim como aconteceu com os pregos, algo parecido acontecia com as palavras. Quando você diz algo que machuca alguém você crava um prego no relacionamento, na emoção, na sensibilidade, na alma daquela pessoa.

Quando você pede desculpas você arranca os pregos, mas as marcas, os furos, nem sempre podem ser apagados. A parede jamais será a mesma, não é mais possível ignorar aquelas marcas.

Você tem toda a liberdade de pregar os pregos que desejar, da forma que quiser, mas tenha a consciência de que, mesmo arrancando os pregos, ficarão furos na parede.

Você tem liberdade de dizer o que quiser, mas mesmo que peça desculpas depois e seja perdoado, os furos dos pregos ficarão. A palavra dita jamais retorna e a marca que elas deixam nem sempre podem ser ignoradas ou apagadas.

Por isso, se queres resultados diferentes, então precisas fazer diferente. É melhor ter mais cuidado com as palavras, com a forma de dizer, para quem diz e em quais circunstâncias.

A solução para uma pessoa não adoecer com o aquilo que guarda não está em colocar para fora, jogando o seu lixo na sala do vizinho. Está no tipo de coisa que produz. Por exemplo, o que produz coisas amargas é a amargura. O que produz coisas doces é a doçura. A escolha do que você vai produzir é sua e não dos outros.

Não é sua a tarefa de julgar a sensibilidade dos outros ou exigir que não se ofendam com o que você diz. Também não é verdade que usar palavras amenas é enganar ou mentir. É possível dizer a verdade de diferentes formas e até a mais dura verdade pode ser dita de forma gentil.

A sua forma de dizer, grosseira e rude, não é uma virtude, se fosse não machucaria tanta gente. A sua forma de dizer é o sinal de que algo não está bem no seu interior. Pode ser a expressão da sua amargura, da sua insatisfação, da sua revolta ou, talvez, da sua insegurança.

Depois de ouvir as palavras do seu avô e de passar por esta experiência, Prolixo nunca mais foi o mesmo, mudou completamente a sua maneira de ver as relações, o valor das palavras e de falar com as pessoas.

A sua vida mudou, ele entendeu o grande poder que as palavras tinham na sua vida e na vida dos que o rodeavam.

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