É mesmo?
Este é um falso imperativo da
nossa época, que pode estar bem equivocado e pode ser causa de problemas na
vida das pessoas que o adotam.
A linguagem tem uma relação íntima
e direta com nossa cognição, com nossa psique, com nossa identidade e com nosso
comportamento.
Na expressão “o que importa é
ser feliz” está implícita a ideia de que a felicidade é O QUE IMPORTA, é O
CARA, portanto os outros valores não importam mais.
Nesta expressão estão presentes
o egocentrismo e o egoísmo. Ela está dizendo que o que importa é a felicidade
de cada um, porque não diz que o que importa é fazer feliz, mas ser feliz.
Esta expressão serve como
antolhos para nós.
Antolho é o nome daquelas barreiras
que limitam a visão lateral dos cavalos, para que eles olhem somente em uma
direção.
Mas nós somos humanos, não
somos cavalos que precisam ser direcionados.
Humanos não podem viver sem olhar
para os lados e ver quem caminha junto.
Somos seres sociais e não podemos ser
felizes se nossa sociedade sofre.
Assumir esta expressão como
verdade e pautar a vida nesta pretensa “felicidade” pode ser bem complicado,
pelo simples fato de que isto não é assim como é dito.
A expressão não corresponde a
uma realidade.
O que é ser feliz para você?
O significado de ser feliz
para você hoje é o mesmo que há 10 ou 20 anos?
O que é ser feliz para você é
o mesmo que é para todas as pessoas que importam a você, que convivem com você,
que estão ligadas a você e que te rodeiam?
Se a felicidade for entendida
como ausência de sofrimento, de problemas, de dores, de conflitos, de tristezas,
então ela não é, nunca foi e nunca será plena e perene.
Este tipo de felicidade não
existe, é uma ilusão, porque na existência humana, não importa quem seja,
sempre haverá conflitos, dores, tristezas, sofrimentos.
Portanto, pautar a vida neste
pensamento, “o que importa é ser feliz”, é um lamentável auto engano.
O
que importa então?
Cada um que sabe da sua vida
que o diga.
Mas deixo algumas dicas.
O que importa é saber passar
pelas dores, pelos sofrimentos, pelas tristezas.
Aquelas que fazem parte da
vida, que são inevitáveis, que não dependem de nós.
O que importa é não buscar com
as próprias mãos mais dores do que a vida já nos proporciona.
O que importa é o que somos
capazes de fazer com nossos conflitos e problemas.
Talvez importe mais fazer
feliz do que ser feliz.
Há muitas coisas acima da
felicidade, porque se tiver que deixar de ser feliz para fazer o bem, para fazer
o que é certo, para favorecer o próximo, então vale a pena.
Houve uma época em que, para
uma parte da nossa sociedade, o que importava era a honra, por ela derramava-se
sangue.
O que importava era a palavra,
o caráter, não importava o quanto isso fizesse um homem infeliz, palavra e
caráter não faziam curva.
Mas é claro que não precisamos
ser tão dramáticos assim, tão drásticos, basta que procuremos o equilíbrio, em
todas as circunstâncias.
Todos têm o direito de buscar a
sua felicidade, mas não deveria ser a qualquer custo, à revelia dos valores
humanos, da vida do outro nem às custas do sofrimento alheio.
Talvez seja mais proveitoso
ter consciência de que os momentos ruins fazem parte da vida e virão
inevitavelmente, e serão ruins à medida da nossa habilidade de lidar com eles.
Tenho visto a busca
desenfreada pela felicidade causar mais dores e sofrimentos do que se a pessoa
nunca a tivesse buscado.
O que importa não é ser feliz,
importa mais é saber passar pelos momentos de infelicidade com serenidade e equilíbrio.
É importante saber passar pela
dor sem negar nem esconder, no intuito de fazer parecer que é feliz.
Para alguns, as dores podem trazer
mais crescimento do a felicidade.
E para finalizar.
Criar uma criança sob este
lema da “felicidade é o que importa” pode ser uma tragédia.
É o mesmo que ensinar a correr
atrás do vento para agarrá-lo com as mãos. Só causará sofrimento ao invés de
felicidade.
Melhor seria ensinar as crianças a lidar com o
sofrimento, com as frustrações, com as dificuldades da vida, com o desprazer, com
o desgosto e com as derrotas. Assim uma
criança pode ter mais chance de ser feliz.
A quem pode interessar que nós
vivamos sob o lema do que importa é ser feliz?
Ora, interessa a quem vende prazer.
Pois muitos relacionam a felicidade ao prazer.
Está triste? Então vai ao
shopping fazer compras, troca de carro, vai à balada, ao salão de beleza, vai
beber, vai usar drogas, vai jogar, vai pagar por sexo e companhia diferente, compre
fantasia, vai consumir algo que lhe dê prazer e que lhe alivie, que lhe faça “feliz”,
vai fazer terapia, vai na farmácia buscar um remedinho milagroso.
Fuja do sofrimento.
Mas na nossa sociedade fugir do
sofrimento pode custar dinheiro, pode sair caro.
Quem ganha com isso?
Quem pode ter sugerido esta ideia?
Esta ideia é mais um elo na
corrente que já temos arrastado, mais uma grade na cela que nos aprisiona.
Libertemo-nos.
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