domingo, 7 de julho de 2019

NOVOS E VELHOS VAZAMENTOS NO PAÍS DAS MARAVILHAS



O nebuloso reinado da mentira e da hipocrisia



Sejamos sinceros.

Não há furo de reportagem nenhum, nenhuma novidade, nenhuma surpresa, todos já sabiam, o Supremo, o Congresso, a OAB, a acusação, a defesa, a imprensa, a esquerda e a direita, eu e você.

Deixemos a hipocrisia e o sensacionalismo de lado, abandonemos este climinha de espionagem barata e vamos aos fatos.

No Brasil é assim desde que os europeus chegaram aqui.

Chegaram e ficaram comprando, enganando, corrompendo, cooptando, doutrinando, escravizando, matando, exterminando, utilizando da mentira e da hipocrisia para aculturar e dominar.

Mas tudo feito sempre em nome nobres ideais.

Em nome de Jesus, da Santa Igreja, da bíblia sagrada, da família, do progresso, do mundo civilizado, do bem do próximo e em nome do cidadão de bem.

No nosso país preso condenado continua cometendo crime, usando celular, usando droga, aplicando golpe e chefiando facção criminosa, tudo de dentro da cadeia.

Então qual é a novidade?

Condenado no Brasil sai da cadeia para cumprir expediente no gabinete, para seções da câmara e continua recebendo salário. Condenado no Brasil é eleito e sai da prisão para a cerimônia de posse. 

Qual é a novidade?

Aqui o Congresso Nacional não representa quem o elegeu e é por si mesmo uma instituição criminosa protegida por lei e financiada por bandidos engravatados das diferentes bancadas.

O Supremo Tribunal Federal não julga livremente e não age com isenção, nunca agiu.

Os Tribunais regionais seguem na mesma linha do Supremo, juízes são corruptíveis, sentenças são negociáveis e a justiça brasileira nunca foi cega, enxerga notas, número de contas, saldos bancários, sobrenomes, cargos, famílias, interesses, partidos e grifes.

Ninguém tem dúvida de que a justiça brasileira não é igual para ricos e pobres, pretos e brancos.

A população sabe disso e os magistrados também.

Onde está a novidade?

Aqui no Brasil a corrupção, a mentira e a hipocrisia começa dentro de casa, no seio da família, e vai até o governo federal, passando pela empresa, pela escola e pela religião.

Há exceções? Sim, certamente há.

E pode ser que você que está lendo este texto faça parte da exceção.
Mas é justamente este o problema.

É exceção e não regra.

Então, onde está a novidade?

No Brasil todo mundo sabe que sempre foi assim, todo mundo sabe onde está o traficante, a boca de fumo, o político que comprou voto, o cidadão que o vendeu, o empresário que financiou, o pastor falcatrua, o padre pedófilo, o médico que vende atestado, o advogado bandido, o marido que bate na mulher.  

Mas o que importa é sair na foto como cidadãos de  bem, senhores e senhoras respeitáveis da sociedade, família de comercial de margarina.

E fazer cara de espanto e escândalo quando os podres aparecem.

Mas este teatro dura só até alguém aceitar o preço, tocar no interesse certo, fazer a oferta irrecusável.

Aqui só é errado quando não é meu ou dos meus, mas quando é dos outros, aí o peito se enche de razão e de podre hipocrisia condenatória.

Amamos apontar o dedo, sem perceber que neste gesto outros três apontam para si mesmo e um para cima.

O clima de sensacionalismo, de surpresa, de furo de reportagem, de “BOMBA!” ajuda a manter o status quo.

Cria-se a roda de fofoca e de comentários, a verborreia vaidosa e desenfreada, as análises pretensiosas, emergem as sabedorias incomuns, as opiniões surpreendentes, as disputas de ideias e tudo morre ali mesmo, no restrito espaço entre a poltrona e o aparelho de tv, entre os olhos e o computador, entre os dedos e a tela de um celular.

E segue o baile, como sempre foi e tem sido há 5 séculos.

Cadê a novidade?

Aqui no Brasil já tiramos ditadores e corruptos?

E substituímos pelo quê?

Pela democracia? Que democracia?

Quem continua tomando as decisões?

Mudam-se os atores, mas os papéis são os mesmos, a peça é a mesma, o palco é o mesmo, o script, o enredo, os financiadores, o cenário, o sistema é o mesmo.

É muito antiga esta estratégia de divertir, de criar o clima de filme de espionagem, de novidade, de suspense e de que o povo importa, interfere e participa.

É velha a estratégia de oferecer o lado bom e do lado mau.

É conhecida a encenação do deteve bom e do detetive mau, para fazer crer os incautos de que há opções, de que há escolha, quando na verdade são apenas dois lados da mesma moeda.

Mas nela não há escolha, somente fora dela.

Você chega no guichê, escolhe seu acento entre dezenas de lugares disponíveis, escolhe o filme, o horário, mas ainda continua dentro do cinema assistindo a um filme.

Se você quer algo diferente deve sair daquela sala, daquele esquema, e olhar lá fora.

Quantos escândalos já presenciamos?

Quantas vezes já achamos que a justiça estava sendo feita? 

Quantas vezes acreditamos nas mudanças feitas por estas mesmas vias?

Quanto salvadores já tivemos?

E em que resultou tudo isso, afinal?

Lembram do quanto falamos de Mariana, de Brumadinho, do Collor, do PC Farias, das privatizações, da greve dos caminhoneiros, da constituinte de 1988, das eleições diretas...???

Quem mandava lá atrás continua mandando; o que queriam fazer, fizeram; os mesmos bancos e grandes empresários continuam mandando e enriquecendo; quem tinha poder continua tendo; as bancadas que moldaram a constituição de 1988 permanecem controlando o congresso e toda a política brasileira; quem perdeu jamais recuperou; o bandido se reelegeu e retornou ao poder; os preços que tinham que subir subiram e os que tinham que baixar baixaram; os acordos foram contornados; arquivos foram queimados; juízes foram comprados; pessoas desapareceram e continuam sumindo e sofrendo acidentes.

Um escândalo substitui o outro e a diversão continua, o hipnotismo não cessa, a memória falha, a vontade diminui, aquela indignação passa e surge uma nova.

Ora mordida, ora assopro e em meio as contingências do cotidiano vão nos levando no bico.  

As cercas, os caminhos, as cocheiras, os estábulos são colocados e nós aceitamos e seguimos como manada, obediente e crente.

De pão em pão, de circo em circo, as diferenças de classes vão se aprofundando, as distâncias se agigantam e a capital se distancia das províncias e dos subúrbios.

O sistema só entende um idioma: a ação que o ameaça de fato.

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