sábado, 10 de agosto de 2019

POR QUE NÃO? SE VAMOS TODOS MORRER MESMO.


A perspectiva da morte que valoriza a vida



É provável que tenhamos criado um tabu sobre a morte e tenha sido justamente isto que desvalorizou a vida.

Lá nas cavernas, com tantos perigos e predadores, com a morte nos rondando, nos espreitando e ameaçando o tempo todo, lutávamos pela vida incansavelmente. Aliás, era só o que fazíamos.

As coisas mudaram. Com o passar do tempo e com a evolução, os perigos e ameaças diminuíram e nossa expectativa de vida aumentou consideravelmente.

A sensação de segurança aumentou. Vieram os confortos e os prazeres e resolvemos que melhor seria esquecer que somos mortais e que nosso fim é nossa única certeza.

Mas é aqui que pode estar o erro


Já aconteceu com você ou com alguém que você conhece de achar que a vida não tem mais sentido e que não há prazer algum nela?

Já ouviu falar de pessoas que perdem a vontade de viver?

Conhece alguém que tem uma vida completamente sem graça, mecânica, cinza, previsível, sem aventura nem paixão, uma vida sem tesão?

Já ouviu falar de pessoas que diante de uma doença terminal passaram a valorizar cada minuto e cada acontecimento da sua vida?

Já ouviu dizer que existe alguém que tem muita dificuldade de se manter vivo ou de se movimentar, mas luta pela vida com bravura e a saboreia com alegria?

Já ouviu falar de alguém que vivia reclamando da vida, que dizia que não queria mais viver e que sob ameaça de morte implorou para viver mais?

Pois é, parece que a perspectiva da morte é que valoriza a vida.


Mas cismamos em viver como se nunca fôssemos morrer, como se nossa estadia aqui fosse eterna, como se tivéssemos todo o tempo do mundo.

Mas a verdade é que não temos todo tempo do mundo.

Aliás, temos bem pouco tempo do tempo do mundo.

Se fosse para esquecermos a morte e viver como se nunca fôssemos morrer, então porque nasceríamos com esta única certeza na vida, a de que vamos morrer?

A morte é uma certeza, a vida não.

Então porque desperdiçar a preciosa vida com tanta besteira?

Parece que fomos feitos para funcionar como a lei de oferta e da procura, quanto mais produto disponível, menor o valor, a raridade é o que valoriza.

Então resolvemos esquecer que a vida é coisa rara, a morte é que é certa e sorrateira, pode chegar a qualquer momento, sem avisar.

E assim, convencidos falsamente de que ela nunca acabará, desvalorizamos a vida.

Não moramos mais em cavernas, não temos mais os mesmos predadores nem a mesma vulnerabilidade, mas temos outras tantas.

Não são poucos os relatos de pessoas que tiveram uma vida dedicada ao trabalho, ao dinheiro, foram rabugentas, plantaram discórdia, lutaram com mil fantasmas, cultivaram sofrimentos e preocupações e diante de um diagnóstico fatal, que lhe deu pouco tempo de vida, passaram a valorizar cada minuto, cada oportunidade e cada pessoa diante de si.

Libertaram-se de rótulos, abriram a mente, despreocuparam, deixaram de se importar com a opinião dos outros, com ninharias e mesquinharias.

Deixaram de brigar para defender sua razão, para vencer discussões ou por outras pequenezas deste tipo.

Pararam de sentir pena de si mesmas, de se sentirem ofendidas com tudo, de valorizar demasiadamente o que não tem valor.

Focaram no que interessa, amar e viver, porque a morte bate à porta.

Então por que não? Se a gente vai morrer mesmo.

Por que não rir de si mesmo, não rir das próprias gafes e tolices?

Por que não fazer aquela viagem, não realizar aquele sonho antes que seja tarde?

Por que não dizer eu te amo, me perdoa, eu estava errado ou errada?

Por que não aceitar alguém e se aceitar também?

Por que não perdoar e se perdoar?

Por que não dizer fica comigo, eu te quero e te desejo, o amanhã pode não vir, amor?

Por que não fazer o que “dá na telha”, se vamos morrer mesmo, a qualquer momento?

Por que não mudar tudo, mandar às favas o que machuca e murcha nossa vida?

Não temos a vida toda pela frente coisa nenhuma.

Quem disse isso quer apenas que andes nos trilhos, justamente onde o trem te esmagará.

Quem garante que vida toda é essa que se tem pela frente?

Só há probabilidade, porque pela frente, de certo mesmo, temos a morte.

Então viva rápido, intensa e levemente, como se fosse morrer amanhã. 

Porque você vai mesmo, só não sabe qual amanhã será, mas será.

E é assim que somos, assim nos constituímos, seres com certeza da morte, que desperdiçam a vida.

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