sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

UMA BIBLIOTECA NO BOLSO


A experiência da leitura



Antes de começar a escrever sobre livros e a dar dicas de leitura aqui no blog, quero refletir um pouco sobre a ação de ler, sobre o hábito de ler, sobre a posição do leitor.

Além de ser formado em letras e de ser professor de literatura, sou um leitor ávido desde a minha adolescência. Por isso eu sei que o cheirinho do livro tem significado, provoca uma sensação no leitor, proporciona prazer. A experiência da leitura ultrapassa muito o ato de ler.

O hábito de ler sempre foi nobre, porque ler era um privilégio de poucos, que pertenciam à nobreza. Poucos afortunados aprendiam a ler e tinham acesso a livros. E livro não era algo popular, não era facilmente reproduzido.

Desde o escriptorum, local do reino onde se reproduziam os códices, os livros em rolos de pergaminhos, até o tablet e o celular conectados à internet, passando pela impressão com tipos móveis, criada por Gutemberg, no século XV, a experiência de leitura vem se modificando constantemente.


Até a posição, a postura do leitor vem mudando. Antes usava as duas mãos, os dois braços, em posição de desenrolar o livro. Depois folheava o livro e hoje movimenta as páginas digitais e abre links com a ponta de um dedo e, talvez, com comando de voz.

Mas a grande vantagem em toda esta evolução é a popularização, democratização e universalização da arte da escrita. Com um tablet ou smartphone é possível acessar livros traduzidos de todo o mundo e de todas as épocas. E é possível levar no bolso, para onde for, uma biblioteca com milhões de livros à disposição.

A internet é chamada também, em áreas de conhecimento como a Teoria da Literatura, Teoria da Comunicação ou Análise do Discursos, de hipertexto. Ou seja, um texto gigantesco composto de tudo o que nele é escrito, mudando o tempo todo, prestando ou não. Há, portanto, muito lixo, mas também há muitos tesouros.

Se na internet encontra-se lixo como fake news e panfletagem barata, também se pode ler gratuitamente a Eneida, de Virgílio; O Processo, de Kafka; O Inferno, de Dante; Dom Quixote, de Cervantes; Os irmãos Karamázov, de Fiódor Dostoiévski e praticamente todas as grandes obras, as maiores já produzidas na história da humanidade, das antigas às mais recentes.


Estar entre prateleiras de livros tem seu valor, sem dúvida, mas é preciso reconhecer que nunca antes na história da humanidade tivemos acesso a um número tão grande de obras, de forma fácil e gratuita.

É incalculável a quantidade de sites, aplicativos, empresas, instituições, portais que oferecem ferramentas e obras para leitura gratuitamente.

Por exemplo, a Amazon, além de comercializar grandes obras digitais e impressas, oferece mais de 1 milhão de e-books para você ler de graça e a ferramenta de leitura Kindle, aplicativo que conta com versões pagas e gratuitas, com diversos recursos para tornar a experiência de leitura mais agradável e confortável em diferentes aparelhos, seja em um celular, tablet ou computador.  

Isto significa que as opções de leitura se multiplicaram ao infinito. Mas não só, a postura física do leitor pode variar dependendo do aparelho que esteja usando para ler e sua postura como sujeito leitor também.

A autonomia do leitor aumentou, pode acessar a sua biblioteca gigantesca de onde estiver, bastando apenas sinal de internet e um aparelho para se conectar.

Não é mais necessário um espaço enorme para armazenar centenas de obras, a não ser que se queira.

Economicamente as coisas também mudaram. Os livros impressos no Brasil são, e sempre foram, caros e quem gosta de ler não lê apenas um livro por mês.

Os aplicativos e aparelhos possibilitam fazer mudanças na fonte, na página, acessar links, tornar a tela mais confortável à visão etc.

Não, caro leitor, os avanços tecnológicos não significam a morte do livro impresso nem que você tem que aderir a eles ou se desfazer dos seus amados livros. Muito pelo contrário, através da internet podemos comprar livros impressos de todo o mundo, estando em qualquer lugar, sem precisar que neste lugar tenha uma livraria e ainda pagando mais barato.

Foi um longo caminho desde os pergaminhos até aqui, não foi?

Quem diria que há alguns séculos somente alguns nobres tinham o direito de ler. E veja, hoje, a facilidade de acesso, a democratização da leitura e da literatura.

Mas há aquelas pessoas que dizem que não gostam de ler. O que eu duvido. Não creio que esta seja uma postura definitiva, acho que apenas estas pessoas não receberam a orientação correta nem a indicação de um livro que faça eco no se ser. Ainda assim, todos têm a liberdade de ler ou de não ler.

E há os que leem, que exercem este direito, que usufruem das facilidades do hipertexto, mas escolhem mal, escolhem se alimentar de lixo, de falsos filósofos, de teorias estapafúrdias, de mentiras, de falácias, lendo engano. O que não deixa de ser uma liberdade, quem irá lhes negar tal direito? Ninguém.  
A grande e democrática oferta colocou o leitor em uma posição diferente. Passa a exigir que o leitor tenha autonomia, ele passa a ter liberdade de escolha. Mas o leitor, agora, precisa de critérios para exercer a liberdade de escolha, sob pena de naufragar no enorme oceano de opções.

E é aí que, tentando se achar, muitos se perdem.  

Não sou marinheiro, mas nesse mar, da leitura e da literatura, arrisco-me a dar pitaco, pois como dizia o poeta: “Navegar é preciso”.

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