Quem precisa de um emprego? III
Cheguei a ficar 36 horas sem comer e tive
que dormir na rua uma vez, mas eu não desisti e venci.
Eu
entrei no curso de Letras e Literatura, de língua portuguesa, em uma universidade
federal aos 29 anos. Na ocasião eu
estava trabalhando de auxiliar do auxiliar na construção civil, fazendo o
trabalho mais pesado, e eu sabia que não tinha estrutura física para aguentar
aquilo por muitos anos.
Não
via muita luz no fim do túnel, havia acabado meu segundo casamento, tinha um
filho de cada casamento, não tinha profissão definida, mas gostava de estudar,
amava a literatura e, como contei no artigo anterior, tinha tido uma linda experiência
trabalhando com crianças com necessidades especiais em uma escola.
Então tomei a decisão de que me tornaria
um professor.
Já
fazia 13 anos que eu havia parado de estudar. Pedi material para amigos e
conhecidos, livros e apostilas e passei a estudar sozinho, à noite, no ônibus,
nos finais de semana, no intervalo do almoço, no banheiro, em todo momento e
lugar.
Abriu a inscrição para o vestibular e eu não
tinha dinheiro para fazer, mas um certo fim de tarde, caminhando e conversando com
um casal de amigos meus pelo canteiro da Hercílio Luz, achei R$ 50,00 embaixo
de um banco de praça, eu tinha R$ 20,00, a inscrição era R$ 70,00, fui lá e fiz,
nos 45 minutos do segundo tempo.
Chegou o dia
da prova do vestibular, fui confiante, fiz e passei.
Comecei o curso de letras, que era pela manhã,
não pude mais trabalhar com ajudante na construção civil. Tinha que estudar,
pagar aluguel, comer, pagar pensão para 2 filhos e estava sem emprego. Recorri a
uma bolsa de trabalho na Universidade e fui trabalhar na Biblioteca Central. Espalhei
para os colegas de sala, para amigos, parentes, todos que eu encontrava que eu
precisava de um emprego. Precisei da bolsa da Universidade apenas aquele
primeiro mês, porque uma colega da minha turma me conseguiu um emprego em um
shopping.
Trabalhei lá por 2 anos e saí de lá para dar
aulas. Fui contratado por uma escola particular incrível, porque eu acompanhava
um professor meu que dava assessoria para os professores de português daquela
escola, uma noite por semana, na minha noite de folga no shopping. Eles me
conheceram e disseram ao meu professor da Universidade que queriam me
contratar. Que felicidade! Medo também, mas meti a cara, me preparei bastante,
estudei muito e fiquei naquela escola por 5 maravilhosos anos. Eu era o
professor, mas acho que lá eu aprendi muito mais do que ensinei.
Então, pareceu fácil? Não foi, nada fácil.
Cheguei
a ficar 36 horas sem comer e tive que dormir na rua uma vez, mas eu não desisti
e venci.
Meu salário do Shopping ia metade para um filho
e metade para outro. Então eu vendia o vale transporte e o vale refeição no
mercado negro para pagar o aluguel e todo o resto que você pode imaginar. Andava a pé, 7 quilômetros da Universidade até no shopping e mais uns 4 até
onde eu morava, à noite, quando saia do shopping, às 22:30h.
Passava todos os dias na frente
daquela escola e me via lá dentro, e um dia eu estava lá mesmo.
Isso
tudo aconteceu entre 1998 e 2000, quando comecei a lecionar e então as coisas
começaram a melhorar. Passei por outros momentos difíceis, nunca fiquei rico
nem tive sucesso, porque não persegui estas coisas. Se tivesse buscado isso
teria alcançado. Na verdade, não tenho nada de material, porque não busquei
estas coisas. Tenho sim muitas experiências lindas, algumas doloridas, mas ainda
assim importantes. Muitas viagens de moto, por vários países, uma das minhas
paixões. E hoje eu posso estar aqui escrevendo, vivo de escrever, só preciso do
meu notebook, de internet e da minha moto. Não leciono mais em escolas, apenas
particular ou para pequenos grupos, capacitando as pessoas para dominarem a escrita.
Então,
quem precisa de um emprego?
Você
precisa de um emprego?
Quando
aceitei qualquer emprego eu tinha um objetivo maior. Quando eu vi que não tinha
este objetivo maior, tratei de criar um. Os empregos serviram de ponte apenas
para eu atravessar momentos difíceis e para eu não deixar de fazer o que eu tinha
que fazer, fosse por obrigação, fosse por paixão.
As
dificuldades podem ser lições, as feridas tornam-se cicatrizes, no corpo e na
alma, mas também se tornam maturidade, força, compreensão, coragem e até
serenidade.
Nunca
desista dos seus sonhos, dos seus projetos, busque-os com tesão, com paixão,
com força, mas aquela força e aquela vontade que vem lá das entranhas, e nem a
fome nem o frio nem a dor nem a saudade serão capazes de te parar. Eu garanto!!
Liberte-se.
Espero
ter ajudando em alguma coisa com este artigo. Ainda voltarei a este assunto.
Até
o próximo.
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